sábado, 9 de agosto de 2014

historias de games !!!!!!


Tenho 27 anos, estou tentando minha segunda faculdade, já desisti da primeira, mudei da minha cidade (interior de SP) para tentar outro curso, mas tem um problema que enfrento há muito tempo, sou viciado em jogos de videogame.
Atualmente jogo o Dota, jogo online, com meus amigos do interior e isso tem me atrapalhado muito. Sei que tenho que estudar, mas já passei noites inteiras jogando mais de 16 horas seguidas. Fico com raiva, brigo comigo, brigo com meus amigos, o jogo me deixa maluco, mas é difícil parar.
Eu deleto o jogo depois reinstalo, me culpo, mas sempre volto. Sei que minha primeira faculdade foi prejudicada por causa disso, quando viajei para a Austrália para estudar também interrompi o curso, pois ficava jogando lá.
Meu sono ficou prejudicado, minha alimentação também (ganhei 25 quilos) e meus relacionamentos sociais são quase zero aqui em São Paulo. Estou tentando retomar o controle da minha vida nas mãos, mas tem sido difícil.
Como você poderia me ajudar?
Um Abraço”
Meu caro,
Sei bem como é isso, já passei 6 meses de uma fase tumultuada da vida, guerreando contra gauleses e romanos por um pedaço de terra virtual e, em outra fase, me vi cuidando dedicadamente de muitas vaquinhas e plantações de trigo no celular.
No primeiro caso só parei depois de ser flagrado por uma ex-namorada, às 4 da manhã, atualizando o jogo – coloquei o celular para despertar, para criar o rei do meu império online.
Honestamente, me senti um completo idiota por ficar tentado ao pensar se deveria desistir do rei ou do relacionamento. Foi difícil deixar “meu reinado” de lado.

Quando a vida paralela supera a real

Esse é o grande problema quando falamos de jogos em geral: eles criam uma sensação de que naquele mundo, criado com gráficos simples ou complexos, podemos tudo.
Quem não gostaria de se sentir no papel de um piloto de corrida ou de um caça que persegue ferozes jatos inimigos?
Quem já não sonhou em voar, ter garras de adamantium ou poderes especiais?
ace-combat-6-screenshot-big
Ah, Ace Combat…
Essa vida criada nos jogos se torna um mundo onde a aparente ilusão de controle traz tranquilidade, segurança e previsibilidade ao mesmo tempo que pode estimular, excitar e distrair de todo o resto.
Mesmo aqueles que alegam ver inúmeros desafios num jogo, ainda assim, as manobras se resumem a pequenas combinações de botões em situações pré-construídas pelo designer.
Na vida offline quase nada é nítido e óbvio.
Isso nos apavora.

O poder dos jogos

Muitas pessoas se questionam se jogos de videogame induzem comportamentos na pessoa fora do jogo, mas eu vejo uma concomitância e não necessariamente uma causalidade, é a personalidade usual do sujeito que realimenta o jogo.
Os pesquisadores da Universidade de Brock no Canadá encontram aumento de agressividade em jovens que jogam games, no entanto, segundo o estudo:
“A análise levou em conta alguns outros fatores na vida dos adolescentes que provavelmente explicariam o aumento da agressão, incluindo “sexo, divórcio dos pais e uso de drogas.”
No entanto, o estudo deixa em aberto a distinção entre correlação e causalidade.
Como não existe um estudo conclusivo, ainda noto que as personalidades mais aderentes à violência do jogo são aquelas que tem comportamentos agressivos ou passivo-agressivos (agressividade contida em forma de negligência) – como no caso do chinês que esfaqueou um amigo.
Cada jogo tem sua personalidade e narrativas próprias, uns inspiram ação, outros liberdade, muitas exacerbam a violência e a maioria evoca no jogador a ideia de que ele é o centro do mundo e a fonte suprema de poder.
Quando um sujeito jogava Mario Bros no nintendinho é como se toda a realidade pessoal se diluísse num objetivo monotemático, salvar a princesa do inimigo. Nessa jornada heróica toda a complexidade da vida se reduzia àlguns pulos e piruetas. Essa é a isca.
Já num jogo como o “Journey“, o que é estimulado e realçada é a fluidez e generosidade. Os tendenciosos a atitudes compassivas se identificariam mais com essa narrativa do que com um jogo como Assassin’s Creed.
Link Youtube
A pessoa que se sente existencialmente fragilizada e sem muito suporte de pessoas queridas, sem um trabalho realizador ou com uma vida significativa estão mais vulneráveis à megalomania associada ao jogo.
Os meninos, em particular, são mais fisgados nessa compulsão, por conta de predominância de testosterona no organismo.
O Dr. John Coates da Universidade de Cambridge percebeu que “o aumento dos níveis de testosterona e de cortisol predispõem os corretores [de bolsa de valores] a tomar riscos“, “no entanto, se a testosterona se tornar excessiva no organismo, como pode ocorrer facilmente em situações de bolhas especulativas, o gosto pelo risco pode se tornar obsessivo”.
No jogo, o cérebro produz sensações de recompensa e prazer que ganham disparadamente se colocadas lado a lado com a interminável sensação de não realização pessoal que muitas pessoas carregam.
Eu diria que é até uma covardia competir com a sensação agradável produzida neurologicamente por um jogo. Como disse no texto do alcoolismo, o risco está nesse detalhe.
Segundo o médico André Malbergier, professor do Departamento de Psiquiatria na Faculdade de Medicina da USP:
“Já está demonstrado que existe no nosso cérebro um circuito de recompensa, na verdade uma estrutura bastante rudimentar (…) que vai mediar nossa relação com situações de prazer, como fazer sexo, ir às compras, comer uma comida gostosa ou encontrar uma pessoa querida que não víamos há muito tempo.
Sabe-se também que, dependendo do grau de prazer que determinada situação gerou, esse circuito é estimulado em diferentes níveis.
Certos comportamentos e algumas substâncias conseguem fazê-lo de uma maneira que dificilmente seria possível ocorrer na vida cotidiana. É muito difícil dimensionar o grau de prazer experimentado pelos dependentes se o compararmos com o de uma pessoa comum. Talvez seja isso que, depois de algum tempo, os faça declarar que nada mais lhes traz prazer além do sexo, da cocaína ou das compras, por exemplo.
Existe uma alteração no cérebro ligada à liberação de um neurotransmissor chamado dopamina, que é responsável pela sensação de prazer. Ele faz com que a pessoa, por susceptibilidade biológica ou sociocultural, ao entrar em contato com determinado comportamento ou substância, associe tal estímulo ao prazer e bem-estar que está sentindo e que foi provocado pela maior liberação desse neurotransmissor.
No entanto, quando se repete muito tal comportamento ou o uso da droga, a ação da dopamina se esgota, se esvazia rapidamente, a pessoa se sente mal e precisa repetir com mais frequência o estímulo externo para manter minimamente os níveis de dopamina no sistema cerebral de recompensa.”

O ciclo da compulsão

Um game associado a uma vida frágil pode disparar mecanismos compulsivos na personalidade de uma pessoa.
Temos um mecanismo regulador interno de nossas forças psicológicas com a realidade que nos cerca. A cada nova situação que experimentamos, surge uma demanda externa que ativa nossos impulsos e criam colapsos e impasses que precisamos resolver . Cada escolha implica um rumo que nos satisfaz ou não e nesse jogo de forças que vamos obtendo a sensação de realização pessoal.
O ciclo compulsivo é como se fosse um tilt no sistema, que se fecha em si mesmo. Num funcionamento mental saudável a angústia básica que carregamos encontraria um canal de escoamento por meio de uma ação realizadora, já na compulsão ela começa a ser retroalimentada por um prazer imediato e repetitivo.
O apertar frenético e viciante de botões do Megaman

Assim como o rato do experimento de Skinner, passamos a apertar a barra de metal para conseguir o pedaço de comida a tal ponto que a comida se torna secundária e só nos fixamos em apertar a barra de metal.
← Postagem mais recente Postagem mais antiga → Página inicial

0 comentários:

Postar um comentário